liceu de Castelo Branco 1974

Um espaço de partilha da Geração de Abril dos antigos alunos do Liceu de Nuno Álvares

sábado, abril 30, 2005

25 de Abril
Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo
(Sophia de Mello Breyner Andresen)

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Já agora, uma sugestão: leiam o Reconquista de dia 29/04/05, que publica a reportagem da nossa festa. Caso já não tenham acesso à edição electrónica desse dia, aqui vai a reprodução de algumas das histórias:

Nos 31 anos da Revolução
Alunos de 74 voltam ao Liceu
Os alunos que frequentavam o Liceu de Castelo Branco a 25 de Abril de 74 reuniram-se no domingo para relembrar velhos tempos. Ao grupo juntaram-se outros antigos estudantes da escola, num total de 150 pessoas, pelo que não faltaram reencontros e recordações que histórias de idos meses de Abril.

Em Abril de 1974 eram jovens estudantes no Liceu Nuno Álvares, em Castelo Branco, mas tinham uma forte consciência política, apesar da organização social lhes limitar os movimentos, a criatividade e a opinião. Lutaram por isso contra o regime, numa altura em que a sinceridade de opinião podia ser um crime e em que uma simples folha de papel era, muitas vezes, uma arma.
Hoje são homens e mulheres na casa dos 40 e com muitos projectos de vida concretizados, mas nem isso lhes faz esquecer um tempo de mudanças profundas nas suas vidas e no país. A Revolução de Abril foi há 31 anos, mas como os estudantes que então frequentavam o Liceu não se esquecem, no domingo assinalaram a data com um convívio que incluiu o descerramento de uma placa alusiva ao evento no Átrio da Escola.
Pelo meio, muitos puderam ver ou rever o filme Capitães de Abril, na Biblioteca do Liceu. Mas o sal do convívio esteve no reencontro de colegas, no relembrar de velhas histórias da altura em que a moldura humana do Liceu perdeu o aspecto sisudo imposto pela ditadura, para ganhar uma vida marcada pela democracia revolucionária e urgente.
Antes da Revolução, até ao 5º Ano (hoje 9º) não existiam turmas mistas. Os rapazes entravam pelo pátio do lado esquerdo e as raparigas pelo do lado direito. A porta principal era para os professores e os alunos não se podiam juntar no átrio. As aulas eram marcadas pela sapiência do professor e as notas, sobretudo nos anos terminais, definiam quem ia, ou não a exame.
Com a Revolução, tudo começou a mudar. “Começou a reivindicação dos exames, a abolição da disciplina de Organização Política e Administrativa da Nação, na qual estudávamos a constituição e a organização do Estado, e que foi substituída pela Introdução à Política”, esclarece o então finalista Luís Rosa. Mas as mudanças chegaram também às médias de acesso à faculdade, que foram baixando. “De 14 baixou para 12 e depois para 10. O mesmo significava dispensar às orais. A grande alteração foi aí”, adianta.
As aulas também passaram a decorrer a outro ritmo, mas não aconteceu a situação de “tomem lá o curso”, afirma Luís Rosa, o qual prossegue: “Eu ainda fiz exames”. Mas a tendência era para acabarem. Até o exame de aptidão à faculdade foi sendo progressivamente abolido, sendo que, entre os finalistas, “uns fizeram e outros não”. O certo é que nenhum finalista acabou por entrar na faculdade naquele ano. “O ingresso foi cancelado. O pessoal foi arregimentado para o serviço cívico, para as brigadas de alfabetização e outros serviços. Mais tarde surgia o ano propedêutico e depois o 12º Ano”.
Mas o serviço cívico não funcionou, pelo que a larga maioria dos estudantes finalistas acabou por ter um ano de férias. “A maior parte da malta baldou-se ao serviço cívico. O País não teve capacidade de organizar isso para a malta ir. De modo que ninguém foi”, esclarece Afonso Camões, também ele finalista. Só que nem tudo foram facilidades. Luís Rosa acabou por perder o direito de adiamento de incorporação na tropa. Mas o tempo e a democracia acabariam por resolver este e outros problemas.


Memórias do dia da Revolução
Os alunos que frequentavam o Liceu de Castelo Branco a 25 de Abril de 74 reuniram-se no domingo para relembrar velhos tempos. Ao grupo juntaram-se outros antigos estudantes da escola, num total de 150 pessoas, pelo que não faltaram reencontros e recordações que histórias desses idos meses de Abril.
As notícias da revolução correram depressa, mas nem todos os alunos souberam da mesma forma e ao mesmo tempo, pois se Afonso Camões garante que “para muitos, esse foi o primeiro contacto que houve com outras ideias e sobretudo com a ideia de democracia”, o certo é que, segundo José Lopes (Zito, para a rapaziada), “já havia aqui (no Liceu) um grupo de alunos com bastante consciência política”.
João Goulão, hoje professor de 47 anos, frequentava então o 5º Ano e tinha teste a Matemática nesse dia, “com o engenheiro Hormigo”, mas chegou à escola já sem intenção de fazer a prova. “Morava em frente da escola Industrial (actual Escola Amato Lusitano) e quando vinha para cima vi militares junto ao Edifício dos Emblemas. Também o meu pai, que ouvia a BBC todos os dias, tinha ouvido o rádio de manhã e disse-me, pelo que estava minimamente informado sobre estas coisas”.
Na escola apercebeu-se de “uma movimentação fora do normal”, algo que Afonso Camões também recorda: “Entre as 8 e as 8h30 soubemos que havia um movimento militar em Lisboa. A notícia espalhou-se como um fósforo”. Mas no centro da cidade também havia sinais de que algo se passava: “Ao passar junto à esquadra da PSP, apercebi-me que havia movimentações diferentes, que as polícias estavam recolhidas. O próprio quartel, onde hoje são serviços camarários, tinha a sentinela recolhido”, afirma José Lopes.
Os alunos mais velhos, sobretudo os que se interessavam pela política, decidiram ir buscar o reitor, que estava a dar aula no primeiro andar. Uma história que João Goulão recorda: “Éramos uns 20 ou 30, aqueles que estávamos mais politizados. Fomos à porta da sala. Voltámos aqui para a Reitoria. Estava eu, o Passarão, o Afonso Camões e outros. O reitor chegou, um pouco aflito… e lembro-me da mulher entrar, um pouco em pânico e ter-nos dito: «Não façam mal ao meu marido. Ele nunca roubou nada. Nós nem temos dinheiro para comprar um carro»”. “Havia quem quisesse defenestrar o Reitor”, adianta o então também finalista Afonso Camões. Mas tal acabou por não acontecer pois “o 25 de Abril não foi feito para se fazer mal a ninguém”, conclui. O certo é que o Reitor, José Catanas Diogo, não acabou expulso da escola, mas deixou de exercer o cargo num dia marcado por grande agitação nos pátios, com as pessoas a “conversarem muito e a trocarem ideias”, como refere João Goulão.


Os Comunicados
Foram muitos os comunicados que marcaram a época do 25 de Abril no Liceu de Castelo Branco. Num deles, a que tivemos acesso, datado de 6 de Janeiro de 75, os alunos acusavam o professor de não ter aceite a ideia de um aluno que apontou a Espanha como um regime fascista. Perante esta “atitude reaccionária”, os alunos prometiam denunciar o caso, além de faltarem colectivamente ao teste, alegando a injustiça de que tinham sido alvo e a “falta de conhecimentos motivada pela incompetência do professor”. A contestação estudantil estava então no auge.

Talvez um livro...
O ortopedista Moisés Louro, que estudava no 5º ano do liceu à data do 25 de Abril, considera que o conjunto de comunicados, fotografias, cartazes, livros e autocolantes que marcaram a luta estudantil antes de depois de 1974, em Castelo Branco, poderiam ser compilados em livro. Ele próprio guarda várias recordações desse tempo e disponibiliza-se para as emprestar, a fim de poderem ser reproduzidas, esperando que outras pessoas possam agir da mesma maneira.


O Nívea e a sala da bufa
A Revolução de Abril veio a calhar a um conjunto de alunos do então Liceu Nacional de Castelo Branco que, três dias antes, na calada da noite, entraram por um buraco da rede e distribuíram um comunicado dos estudantes de medicina de Lisboa contra a guerra colonial e contra a revolução que derrubou o governo de Salvador Allende, no Chile, instaurando uma ditadura militar.
É que a polícia andava “em cima” para descobrir os autores, muitos deles especialistas em fugir ao “Carro Nívea”, que é como quem diz, ao Volkswagen carocha azul e branco que rondava o Liceu à noite. Mas nem por isso os estudantes se inibiam. Enquanto o Nívea dava a volta, um a um, lá iam saltando pelo buraco da vedação para se reunirem na sala da Mocidade Portuguesa, a sala da cave traseira esquerda do liceu, conhecida entre o grupo como “Sala da bufa”.
“Conseguimos arranjar uma chave da sala e reuníamos ali quase todas as quintas-feiras, onde tínhamos algumas discussões políticas, onde aqueles mais entendidos nestes assuntos versavam alguns temas sobre a situação do País”, adianta João Goulão. Ainda assim, mesmo para esses alunos, a revolução acabou por ser uma surpresa. “Depois do 16 de Março (quando falhou a tentativa de golpe que partiu das Caldas) ninguém estava à espera que isto fosse tão depressa”, diz Luís Rosa.
Mas foi para satisfação de todos e do grupo das reuniões em particular, do qual faziam parte “o Carrilho, o Camões, oPassarão, o Tó Luís, o Jorge Baptista, mas sobretudo o Carrilho, que era aquele que nos dava mais informações nessas reuniões tidas à luz da vela”, adianta João Goulão. Mas Luís Rosa também lembra a figura de Louro Carrilho: “Chegava-me a dar papéis nas aulas! No 26 de Abril, no primeiro comício, nas escadas da Câmara, o Carrilho foi ler um comunicado do MRPP, a dizer que era contra o 25 de Abril porque era uma revolução burguesa”.

A Primeira Associação Democrática
Na altura da revolução o Liceu não tinha associação de estudantes, mas a lacuna foi rapidamente suprimida, com a eleição, pelo método do braço no ar, no pátio interior esquerdo. Alguém referia os nomes e a massa de alunos manifestava o seu acordo ou desacordo, num coro ensurdecedor. Saíram assim os primeiros eleitos, casos de Louro Carrilho, Afonso Camões, Luís Rosa, José Francisco, Jaime, Jorge Baptista, Louro Carrilho, Guida Chagas, Eduardo Soares… “Foi uma associação ad-hoc. Era a comissão pró-associação. Só no ano seguinte é que houve uma associação presidida pelo Jaime de Jesus”.